OFICINA/MINI-CURSO:




Brinquedos e Brincadeiras na Escola: benefício concedido ou direito garantido?


Ementa:
O conceito de ludicidade e seu uso na educação; entendendo o brincar como um Direito da Criança; a organização do espaço para o brincar; a infância e suas especificidades; o perfil do professor brincante e a valorização da cultura infantil na escola. 

Objetivos:
  • Conceituar o termo ludicidade e o seu uso na educação;
  • Defender o direito ao brincar entendendo-o como uma necessidade para o desenvolvimento da criança;
  • Oportunizar aos participantes a organização de um espaço que lhes permitam usar a criatividade;
  • Re-significar as brincadeiras tradicionais  como elemento de preservação da cultura  e dos laços entre as gerações;
  • Perceber a importância do brincar na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental;
  • Conhecer os vários tipos de brincadeiras e jogos que as crianças brincam na rua;
  • Despertar o “ser lúdico” que se encontra em estado latente em cada um de nós;
  • Voltar para si, soltar o corpo e eliminar as tensões para a realização de um trabalho mais ativo e produtivo.

Justificativa:
 Os últimos estudos que realizamos sobre a importância do brincar e sua inserção na prática pedagógica  da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, nos fez refletir a cerca da existência de um campo de contradições entre o papel que o brincar ocupa na prática educacional - demasiadamente pequeno -  e o espaço considerável que esse ocupa nos discursos e teorias sobre essas práticas. Todavia, talvez influenciados pelas teorias da psicologia do desenvolvimento infantil, os professores que trabalham direta ou indiretamente nas instituições de ensino parecem reconhecer a importância que o brincar tem para o desenvolvimento das crianças, atribuindo a ele um papel fundamental (Rocha, 2005). O que não se pode negar, é a satisfação manifestada pelas crianças no contexto de uma pedagogia que valoriza as experiências lúdicas como mediadoras, e porque não dizer, promotoras do processo ensino-aprendizagem
Diante desses pressupostos, temos observado que o brincar tem sido compreendido pelas escolas como modismo, um agrado, um prêmio por algo realizado ou, o não brincar, como punição por infração de normas, um benefício concedido e não como um direto da criança, que deve ser garantido, por se tratar de uma necessidade, e estar assegurado em Lei.
Pensando nisso decidimos, fugindo dos padrões convencionais com que temos abordado o assunto, realizar essa oficina/mini-curso com o tema: “brinquedos e brincaderiras na escola: benefício concedido ou direto garantido?”, a fim de mostrar a todos que trabalham com crianças, e se interessam pelos estudos sobre o brincar, as diversas facetas de um mesmo tema, fundamentado em teorias e práticas que valorizem a criança como sujeito dos direitos e o brincar como exercício de cidadania e não apenas como simples passa-tempo.

Público Alvo:

Graduandos em Pedagogia, Pais e Professores (as) de Educação Infantil e 1º ao 5º ano do ensino fundamental.

Carga horária/nº de particpantes:

O curso terá uma carga horária de 16 horas podendo ser adaptado para 12 ou 8 horas, atendento no máximo 60 pessoas

Obs: Os participantes deverão trajar roupas leves e confortáveis.

Atividades:


  • Exposição oral;
  • Leitura e análise de textos;
  • Roda de conversas;
  • Construção de painéis;
  • Oficina de brincadeiras:
  1. Musicografias – “Pode cantar que eu danço”
  2. Brinquedos cantados – “A magia do corpo pelo movimento”
  3. Brincadeiras tradicionais – “O pião entrou na roda...”
  4. Jogos cooperativos – “Ninguém vai sair... Todos vão brincar?”
  5. Brincadeiras (im)possíveis – “Será que vai dar?”
  • Histórias:
  1. Literatura infantil – “Era uma vez...”
  2. Contos populares – “Quem conta um conto aumenta a simpatia”
  • Os cantinhos do brincar;
  • Oficina de danças:
  • Danças circulares – “E nessa ciranda o mundo inteiro, é meu, é seu....”  
  • Oficina de Brinquedos¹
Materiais e equipamentos:

Aparelho de som; caixa amplificada; cadeiras tipo escolar sem braço; papel sulfite; papel de seda nas cores vermelha e verde; balões coloridos; massa de modelar; hidrocor; caneta azul; lápis de cor; giz de cera; tinta guache (várias cores); tinta facial; papel metro (branco ou amarelo); fita adesiva; fita crepe; barbante; tesouras; jornais; revistas.
Bibliografias:

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei Federal 8069 de 13/07/1990.

______. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.

______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a Educação Infantil. MEC/SEF, 1998. 3v.

BROUGÈRE, Gilles. Brinquedo e Cultura / Cilles Brougère ; revisão técnica e versão brasileira adaptada por Gisele Wajskop. – 5ª ed. – São Paulo, Cortez, 2004. – (Coleção Questões da Nossa Época; v. 43).

 

CRIANÇA, Pastoral. Brinquedos e brincadeiras na comunidade. Pastoral da Crianças – Curitiba, 2005. 192p.; il.; 20,5x27,5 cm (contém anexos).


KISHIMOTO, Tizuco Morchida. Jogos Infantis: o jogo a criança e a educação/ Tizuco Morchida Kishimoto. – Petrópolis, RJ : Vozes, 1993.

KRAMER, Sônia. Com a pré-escola nas mãos: uma alternativa curricular para educação infantil. São Paulo – SP : Ática, 2003.

PORTO, Bernadete de Souza. Ludicidade: o que é isso mesmo?/Bernadete de Souza Porto (organizadora). – Salvador: Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação; GEPEL, 2002.

REDIN, Euclides. O espaço e tempo da criança: se der tempo a gente brinca! / Euclides Redin. – Porto Alegre : Mediação, 1998. 85p. (Cadernos de Educação Infanitl).

ROCHA, M.S.P.M.L. Não Brinco Mais: a (des)construção do brincar no cotidiano educacional / Maria Sílvia Pinto de Moura Librandi da Rocha – 2. ed. ver. – Ijuí, Rio Grande do Sul: Ed. Unijuí, 2005.  – 200 p. – (Coleção Fronteiras da Educação).


SANTOS, Santa Marli Pires (Org.). A ludicidade como ciência/Santa Marli Pires dos Santos (organizadora). – Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

________, Brinquedoteca: o lúdico em diferentes contextos. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

________, Brinquedoteca: a criança, o adulto e o lúdico. Petrópolis – RJ: Vozes, 200.

________, Brinquedoteca e Infância: um guia para pais e educadores em creche. – Petrópolis, RJ : Vozes. 1999.

________, O lúdico na formação do educador. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

WAJSKOP, Gisela. Brincar na pré-escola / Gisela Wajskop. 5ª ed. – São Paulo: Cortez, 2001. – (Coleção Questões da Nossa Época; v. 48).

O que é brincar na visão das crianças?


Adriana Meregalli Camargo


 

Durante estes oito semestres do Curso de Pedagogia - Licenciatura Plena,
estudamos sobre o lúdico, os jogos, como trabalhá-los, tudo segundo alguns
autores como Lev Vygotsky, Henri Wallon e Jean Piaget, mas na prática, a
visão das crianças pouco foi discutida, por nós educadoras.

Moreno (apud, Aroeira;Soares e Mendes,1996) fazendo uma síntese dos
principais pensadores menciona que Lev Vygotsky destaca que no jogo a
criança encena a realidade, utilizando regras de comportamento socialmente
constituídas. Para Wallon, o jogo é uma forma de organizar o acaso, de
superar repetições. No jogo a criança manifesta suas disponibilidades de
ação. Jean Piaget, por sua vez, destaca que o jogo representa a
predominância da assimilação sobre a acomodação. Assim, a imitação, o
desenho e a linguagem, contribuem para a construção da representação pela
criança.


 

O desenvolvimento humano decorre de trocas que estabelecem durante toda a
sua vida entre indivíduos e o meio, assim, o jogo permite comportamentos
espontâneos e improvisados, uma vez que há liberdade para a tomada de
decisões e as regras podem ser criadas pelos participantes.


 

Muito se diz que o jogo é importante para as crianças. Em vista disso
pergunto: Por quê? As respostas são as mais diversas: é um momento de
integração, interação, de divertimento, de aprender, de desenvolver
habilidades... Para mim, o jogo é mais do que o simples ato de brincar,
pois no jogo, nas brincadeiras a criança se comunica com o mundo, se
expressa e sociabiliza de acordo com a sua percepção do que é brincar.


 

Foi pensando nisto que resolvi saber qual é a visão da criança sobre o
brincar. Para isso pergunto: o que é brincar para a criança? Existem
momentos mais adequados para brincar que outros? É possível conciliar
brincadeira e estudo?


 

Para responder a estas questões elaborei o presente artigo em três partes.
Na primeira parte teremos uma pequena visão histórica dos jogos e
brincadeiras na sua evolução pedagógica, fazendo uma relação com os
brinquedos de antigamente e os atuais . Na segunda parte, relato a visão
das crianças sobre os jogos e brincadeiras, suas fantasias, imaginação,
brinquedos e brincadeiras prediletos. Na terceira parte destaco a visão
das crianças sobre quais momentos que brincam e se a estes momentos podem
ser conciliados os estudos.


 

As respostas encontradas são fundamentadas a partir da prática pedagógica
realizada no período de 31 de março a 06 de maio de 2003, com uma turma de
3ª série, da Escola Municipal de Ensino Fundamental José Paulo da Silva,
localizada no distrito de Atlântida Sul, Osório.


Alguns aspectos da evolução pedagógica dos jogos


 

As concepções sobre os jogos foram sofrendo modificações ao longo do
tempo. Segundo Kishimoto (1990), Platão já destacava a importância de
"aprender brincando", em oposição a utilização da violência e da opressão.
Já Aristóteles sugeria que para educar crianças os jogos deveriam imitar
atividades sérias, de ocupação adulta, como forma de preparo para a vida
futura. Na Idade Média, era do Cristianismo, o jogo foi banido da
educação, pois era visto pela igreja como algo pecaminoso. Foi no século
XVII, com o Renascimento Italiano que novos ideais foram introduzidos, e o
jogo começa novamente a fazer parte do cotidiano da educação. Nesta época,
os jogos não eram classificados como infantis ou para adultos, por que as
crianças eram vistas como adultos em miniaturas. Rosseau destaca a
necessidade de educar a criança conforme sua "natureza infantil",
apontando para o brinquedo como objeto e ação de brincar. É com Froebel
que o jogo começa a fazer parte da história da educação.


 

É por intermédio dos jogos e brinquedos que a criança adquire a primeira
representação do mundo e penetra no mundo das relações sociais,
desenvolvendo um senso de iniciativa e auxilio mútuo. Brincando e jogando,
a criança reproduz as suas vivências transformando o real de acordo com
seus desejos e interesses.


 

No período de estágio, durante uma brincadeira na hora do recreio, alguns
alunos questionaram-me sobre como eram as brincadeiras antigamente, então
resolvemos pesquisar em casa com os pais e trazer as respostas no dia
seguinte. Foi muito interessante, pois eles descobriram sozinhos, por
meio da sua curiosidade, investigação, a resposta para seus
questionamentos.


 

O questionamento proposto foi o seguinte: como e quais eram os jogos
brinquedos antigamente? Como são os brinquedos agora? São os mesmos? O que
mudou? Descreva sua brincadeira predileta.


 

A ansiedade era grande para expor o que haviam encontrado. As respostas
eram as mais variadas, mas de certa forma, se repetiam. Embora a realidade
de cada família fosse diferente umas das outras, os integrantes das
famílias viviam no mesmo contexto histórico e em culturas semelhantes, nas
quais predominavam os mesmos brinquedos.


 

Os brinquedos eram construídos pelos próprios pais e avós. As crianças
relatam que sabugo de milho servia para fazer boizinhos, carrinhos de
taquara, de madeira ou lata com rodinhas de mandioca, bonecas de pano,
jogo de bolita, jogo da velha, pular corda, subir em árvores, carro de
lomba, cinco marias, amarelinha, cantigas de roda, faziam parte da
infância de seus pais, e como não tinham como comprar brinquedos eles
próprias inventavam suas brincadeiras e fantasias. Como afirma Vygotsky
(1984,p.11): "A ação surge das idéias não das coisas: um espaço de madeira
torna-se um boneco e um cabo de vassoura torna-se um cavalo. A ação por
regras começa a ser determinada pelas idéias e não pelos objetos."
Nas suas respostas, as crianças mencionavam a diferença dos brinquedos
antigos e atuais, hoje alguns brinquedos são mais modernos e sofisticados.
São de plástico, de pelúcia, de borracha, de ferro. "Alguns continuam
iguais e outros mudaram devido a tecnologia, hoje tem vídeo - game,
SKATE", diz um aluno.


 

Por ser uma comunidade pequena, de hábitos simples, os brinquedos como
bola, carrinhos, bonecas, bicicleta, jogo de bolita, cantigas de roda,
brincar de escolinha, jogar futebol, esconde - esconde, gata - cega, pular
corda, jogo do caçador, SKATE, carrinhos com controle remoto, fazem parte
do cotidiano destas crianças. Podemos observar que algumas brincadeiras
"antigas" fazem parte destes tempos atuais vividas pelas crianças.
A tecnologia está tão avançada que os jogos e brinquedos tornam-se
estranhos aos pais. Na sua infância estavam acostumados a brinquedos
simples e modestos que aguçavam mais sua imaginação, criando suas
próprias histórias, suas fantasias, seu mundo de faz-de-conta. Para
Friedmann (1996,p.11): "Os jogos e brincadeiras , evidentemente, mudaram
muito desde o começo do século até os dias de hoje nos diferentes países e
contextos sociais. Mas o prazer de brincar não mudou."


 

A evolução tecnológica está presente em nossas casas nas coisas mais
simples como os brinquedos e jogos eletrônicos. Por isso deve-se ter uma
atenção e interesse maior em saber com o que nossas crianças estão se
divertindo, pois nestas brincadeiras elas também estão construindo sua
aprendizagem, criticidade, criatividade e visão de mundo.


 

A visão das crianças sobre o brincar


 

Baseada em observações que realizei durante aulas de recreação na praça
próxima a escola, relato qual foi a visão das crianças sobre o que é
brincar, seus sentimentos e fantasias em uma das tardes em que fomos a
praçainha . A aula dividiu-se em dois momentos, o primeiro com atividades
dirigidas e o segundo momento com atividades livres, onde as crianças
inventavam suas próprias brincadeiras.


 

Estava uma tarde de sol maravilhosa, ótima para uma boa caminhada,
atividades recreativas e divertidas. Quando disse a eles que iríamos até a
praça, logo começaram a se organizar, preparar o material como cordas e
bolas. A conversa, a euforia e a "bagunça" foi inevitável até chegarmos ao
local. Eles gostavam muito do trabalho em sala de aula, de atividades
diversificadas e significativas, mas com certeza, preferiam atividades
lúdicas e recreativas.


 

Chegando na praça, todos estavam muito alegres, ansiosos pelo início das
brincadeiras. Iniciamos com brincadeiras com bolas, como: bola ao lado,
bola a cima, bola em baixo, caçador... e logo após, passamos as
atividades ou brincadeiras com cordas, como: cabo de guerra, pular corda
em grupos ou individualmente e cada macaco no seu galho. Desde o início
das brincadeiras os meninos clamavam pelo tão adorado futebol, mas não se
opuseram a realizar as atividades propostas.


 

Foi maravilhoso ver o envolvimento das crianças durante as brincadeiras, a
participação, cooperação, integração entre todos da turma. Uma observação
interessante é que não há rivalidade entre os grupos apesar de algumas
brincadeiras estimularem a competição. Estavam sempre trocando de grupos,
para que não se formassem as tradicionais "panelinhas", apesar de uma
determinada dupla sentir receio em se separar, mas não houveram maiores
problemas quanto a separação da mesma, quando necessário.

No segundo momento das atividades, disse-lhes que podiam brincar do que
quisessem, então dirigiram-se para as atividades que mais lhes chamava
atenção. A maioria dos meninos, correram para o campo de futebol, alguns
foram brincar nos balanços junto com as meninas, e o restante da turma
ficaram na quadra pulando corda e jogando vôlei. As vezes havia
revezamento entre os participantes para que todos pudessem participar de
todas as brincadeiras.


 

Terminado o tempo para ficarmos na praça, retornamos para a escola e
durante o caminho fomos conversando sobre as atividades realizadas. Já na
sala de aula, como tema de casa, eles deveriam responder algumas
perguntas como: O que é brincar para ti? O que sentiste brincado na
pracinha? Do que mais gostaste de brincar? Parti do pressuposto que em
casa poderiam refletir melhor sobre as atividades que realizaram durante o
período em que estavam na pracinha.


 

No outro dia, todos relataram suas reflexões, seus sentimentos. Brincar
segundo as crianças é diversão, é alegria, é jogar bola, é brincar de
SKATE, é andar de balanço, é alegria, é uma coisa que toda criança gosta
de fazer. Alguns responderam que "brincando a gente aprende muita coisa",
"é legal porque a gente sabe uma brincadeira e aprende outra", "brincar
para mim é se divertir, porque a gente se esquece de tudo e entra na
brincadeira", relatam dois alunos Outro aluno ainda disse: "Na pracinha eu
me sinto voando, quando estou no balanço ou na gangorra". As crianças
sentem prazer no que estão fazendo, para eles há um significado próprio
para cada atividade, sentem liberdade para se expressar. Isso pode ser
percebido na resposta que uma das crianças deu: "quando a gente brinca
não fica triste". Na praça as brincadeiras prediletas foram gangorra,
balanço, jogar bola, pular corda, pega-pega, esconde-esconde.
Pude observar que este momento é muito mais do que um tempo para as
crianças praticarem atividades físicas ou de recreação. É um espaço que
eles utilizam para se expressar, se comunicar, divertir, esquecer do seu
mundo real para viver em um mundo de fantasia, de sonho, de imaginação. O
ato de brincar para as crianças é um processo onde elas constróem seus
conhecimentos, sua aprendizagem, sua visão do mundo em que vivem,
socializam seus desejos, fazendo sempre aquilo que gostam, que têm
significado para elas, do modo que lhe fazem sentir bem.


 

Será que hora de brincar é só no recreio?


 

Estamos acostumados desde crianças a cumprir regras e horários. Assim,
temos horários para acordar pela manhã, tomar café, almoçar.... enfim
somos programados para seguir determinadas condições que nos são impostas.


 

Na escola não deixaria de ser diferente. Temos horários para entrar,
lanchar, ir para o recreio e para ir embora, logo horário de brincar é na
hora do recreio, fora isto é hora de estudar. Mas será que precisa ser
assim? Friedmann (1996,p.15) afirma que: "O jogo fica relegado ao pátio ou
destinado a "preencher" intervalos de tempo entre aulas. Entretanto, o
jogo pode e deve fazer parte das atividades curriculares."


 

"Não tenho tempo para brincar com as crianças, tenho um currículo a
cumprir". Durante os períodos de estágio, discussões durante o curso,
conversas com colegas professoras ouvi isto, não só em relação a questão
do brincar, mas também em relação as práticas pedagógicas, metodologias de
trabalho, avaliação... entre outros.


 

Na escola é possível planejar os espaços de jogos na própria sala de
aula, aproveitando os recursos disponíveis como classes e cadeiras. No
pátio fica ainda mais fácil, pois o espaço é mais amplo, de fácil
aproveitamento, sem contar que as crianças se divertem muito mais em
aulas ao ar livre.


 

A escola que realizei estágio, por ser uma escola pequena, não possuía
muitos recursos disponíveis em bom estado de conservação, apenas algumas
bolas e cordas, os quais utilizávamos quando íamos a uma praça próxima a
escola, pois como o pátio era muito pequeno, os gritos, barulhos,
atrapalhavam as turmas que estavam em sala de aula.
Como eu já havia detectado que algumas crianças possuíam dificuldades em
algumas áreas da matemática como: dúzia, dezena, multiplicação, fizemos a
hora do bingo. Confeccionamos as cartelas em sala de aula com papel
sulfite e eles deveriam escolher sete números dentre os quais eu havia
colocado no quadro, para inserir em suas cartelas. Em cada rodada poderiam
trocar os números das cartelas. De dentro de um saco colorido eu retirava
as fichas com as operações que eles deveriam efetuar. Quem tivesse na sua
cartela o resultado, marcaria com uma mangueirinha o número (utilizamos a
mesma mangueirinha que confeccionamos para o ábaco). Logo quem tivesse
preenchido toda a cartela primeiro gritaria "bingo" e seria o vencedor da
rodada.


 

Outra atividade realizada, foi a dança da cadeira. Organizamos as cadeiras
em círculo na sala de aula, de acordo com a música eles andavam em volta
do círculo, quando parasse a música, deveriam sentar. Quem ficasse sem
cadeira deveria, iniciar um texto no quadro. O assunto era livre, e assim
os próximos a sair da brincadeira continuariam o texto.


 

Nas duas atividades pude observar que o interesse, a cooperação,
integração e a aprendizagem foram maiores do que se eu tivesse dado estas
atividades no quadro para eles resolverem ou um tema para que fizessem uma
produção textual com assunto determinado.


 

Eles estavam, sem notar, estudando e se divertindo ao mesmo tempo, isso
demostra que é possível fazer com que estes dois itens tão importantes na
vida de uma criança, estudar e brincar, sejam conciliados, não só na sala
de aula, mas também em casa. Buscar informações, temas de casa
diversificados, atrativos, significativos, estimulam mais o interesse,
instigam a curiosidade da criança na busca para encontrar as respostas
para suas dúvidas e até mesmo reforçar o que foi visto diariamente em sala
de aula.


 

Em minha vivência durante o estágio, os estudos, as leituras, fizeram-me
perceber que a educação depende em grande parte da motivação da criança.
Suas necessidades e interesses são muito importantes e devem ser levados
em consideração, por nós educadores, durante as atividades. O educador
tem um papel fundamental na motivação da criança para que haja
aprendizagem. Ele deve desenvolver atividades que instigue na criança a
curiosidade, a vontade de aprender, a busca de informações e
principalmente, que tenha para a criança significado.


 

As crianças devem ser consideradas pela escola como seres sociais,
privilegiando o seu contexto sócio-econômico e cultural, reconhecendo as
diferenças existentes entre elas. Para isso se faz necessário propiciar as
crianças um desenvolvimento integral e dinâmico e oferecer instrumentos
para que possam tornar possível a construção da sua autonomia,
criticidade, responsabilidade e cooperação. Cada indivíduo necessita
construir sua própria personalidade e conhecimentos e para que tal
processo ocorra, o brinquedo torna-se algo fundamental.


 

Não é suficiente dar a criança o direito ao jogo. Para ser uma atividade
significativa é preciso instigar nela o interesse e o desejo pelo jogo, e
para isso não basta somente ampliar o tempo de brincar ou o tempo do
recreio, é preciso que o educador tenha uma nova postura frente as
brincadeiras e ao espaço em que elas acontecem.


 

Considerações Finais


 

Com o passar dos tempos, os jogos e suas concepções foram modificando-se,
evoluindo, de acordo com cada época, com as discussões feitas por autores
e até mesmo, creio eu, por discussões realizadas pelos educadores.


 

Mudaram tanto que os jogos que eram comuns a todos, adultos e crianças,
hoje são mais específicos, há brincadeiras, os jogos infantis e os que são
considerados para adultos.


 

Para muitos os jogos e brincadeiras ainda têm um único objetivo: que as
crianças possam ficar por alguns minutos, ou algumas horas, entretidos,
distraídos. O jogo é mais que isso. No momento em que as crianças estão
ali, concentradas na sua brincadeira, que é tão significativa para ela, a
criança tem a chance, a oportunidade de expressar seus sentimentos,
desejos, interesses, pensamentos, suas idéias e sua visão do meio que a
cerca, e também aprender.


 

Durante a realização das brincadeiras e dos jogos, a criança cria seu
mundo lúdico, sua história. O jogo é uma atividade que dá prazer, libera
as emoções de quem joga ou brinca. Na brincadeira a criança também
aprende, se diverte, enfrenta desafios, interage com o meio e com o seu
interior, isso porque, há motivação e significado para ela.


 

Brincar para as crianças é o momento em que elas se divertem, sentem-se
livres para se expressar, viver no seu mundo de fantasias. Cada atividade
tem seu significado próprio, único para cada um que brinca. A interação
com amigos ou colegas torna a brincadeira mais gostosa, mais divertida,
mas não significa que brincar sozinho não proporcione estes sentimentos a
criança.


 

Penso que na sala de aula, na rua, no pátio de casa, no playground, na
praça, os jogos e brincadeiras, das mais antigas as mais atuais, devem
continuar fazendo parte do cotidiano de nossas crianças, integrado com a
sua realidade e seus interesses. O ato de brincar é mágico, é único,
prazeroso e inesquecível, pois as lembranças de nossa infância guardaremos
para sempre conosco.


Bibliografia

AROEIRA, Maria Luísa Campos; SOARES, Maria Inês B.; MENDES,Rosa Emília de
A. Didática da Pré-escola: vida criança: brincar e aprender. São Paulo:
FTD,1996.


FRIEDMANN, Adriana. Brincar: crescer e aprender - O resgate do jogo
infantil. São Paulo: Moderna,1996.


 

"O melhor brinquedo é um bastão"

A simplicidade de um pedaço de madeira pode ser o melhor incentivo para a imaginação de uma criança


 

Howard Chudacoff, sociólogo americano autor do livro Crianças Brincando: Uma história americana, dedicou-se a pesquisar o hábito de brincar entre as crianças americanas desde o século XVI. Ele usou relatos de diários infantis, documentos históricos e fotos para contar a história de uma das atividades mais importantes da infância. No período estudado, Chudacoff, que é também professor da Universidade de Brown, notou que não só os brinquedos mudaram, mas o lugar onde as crianças brincam e até mesmo a participação dos pais nas brincadeiras. Em entrevista a ÉPOCA, o especialista analisa as mudanças e critica a intenção dos pais de controlar as brincadeiras. "O prazer real de uma criança é criar seu próprio jogo", diz. Ele também defende os brinquedos simples, como um simples bastão de madeira, no lugar dos industrializados e dos eletrônicos.

ÉPOCA - Por que você escolheu estudar esse tema? Qual é a importância das brincadeiras?
Howard Chudacoff
– Porque é um tema muito importante da cultura e muito negligenciado. As brincadeiras nos dizem não só sobre as crianças, mas sobre nós mesmos. Todos fomos crianças um dia, todos temos memórias sobre as brincadeiras, temos idéias sobre como as crianças devem brincar e temos nossas idéias sobre liberdade. Mas, em muitas ocasiões, nós nos esquecemos disso e tentamos guiar e controlar o modo como as crianças brincam sem perceber que o prazer real de uma criança é criar seu próprio jogo.

ÉPOCA - Em seu livro, o senhor afirma que o conceito de infância só foi criado no século XIX. O que mudou para que houvesse essa nova fase da vida?
Chudacoff
– Nos Estados Unidos e em outros países, a urbanização e a redução do papel das crianças na economia doméstica ajudaram a criar a infância como um período separado – especial e valorizado – da vida. Quando as crianças eram necessárias para a economia, trabalhando nos campos ou nas fábricas, era difícil vê-las como diferentes dos adultos. Quando algumas camadas das populações em alguns países começaram a enriquecer, as crianças deixaram de ser necessárias. Especialmente porque a mecanização e a industrialização, ao poupar mão-de-obra, começaram a retirar as crianças dos locais de trabalho. Foi nesse período que surgiu a escola como algo compulsório. Em muitas culturas, adultos não têm espaço para se divertir. Eles têm que ser obedientes a um Deus, obedientes a um mestre, têm que cuidar da família. Espera-se que eles cuidem de coisas sérias, apesar de que até mesmo os adultos tentam divertir-se à sua própria maneira. Mas ficou estabelecido que a infância é o período especial da vida, isolado, protegido dos perigos e das responsabilidades da idade adulta, um tempo não só para a educação, mas também para a diversão. A definição de brincadeira é difícil, mas, definitivamente, brincar é o oposto de trabalhar. Mas nós tentamos estruturar de tal forma as brincadeiras das crianças – não damos liberdade suficiente a elas –, que acabam virando uma espécie de trabalho quando não damos liberdade suficiente a elas.

ÉPOCA - O que mudou nas brincadeiras das crianças do século XVI para cá?
Chudacoff
– O espaço para brincar é onde todas as alterações começam a acontecer. Com a industrialização, as crianças passaram a usar menos os espaços abertos e a natureza para brincar. Elas começam a ficar em lugares mais estruturados: em vez de ir para os campos ou as matas, elas ficam nas ruas ou dentro de casa. Não que não haja mais brincadeiras em espaços abertos, mas elas diminuíram muito. Hoje as crianças brincam mais em lugares construídos para elas, como escolas e playgrounds. Acho que uma das conseqüências dessa mudança é que as crianças são menos ativas em suas brincadeiras. Quando você está em um lugar externo, você caminha mais, corre mais e isso tem uma relação direta com o crescente problema do sobrepeso e da obesidade entre as crianças. A alimentação não é o único fator: as crianças e suas brincadeiras estão menos ativas.

ÉPOCA - O que mudou, no período em que o senhor estudou, com relação aos colegas de brincadeira?
Chudacoff
– Hoje as crianças tendem a brincar mais sozinhas, com um jogo, um computador, um videogame ou mesmo assistindo à televisão. O número de colegas vem se reduzindo porque as crianças não brincam com os vizinhos, não correm pelas redondezas de casa. Elas brincam em pequenos grupos ou mesmo sozinhas. Com a diminuição da taxa de natalidade, as crianças tendem a ter menos irmãos e a ter, como colegas, as crianças de mesma idade, de suas classes na escola. Nos últimos 150 anos, pelo menos, as crianças, nos Estados Unidos, tiveram mais relações sociais com seus pares do que com a família. Não sei quantos amigos são necessários para entrar na vida em sociedade. Se cinco ou seis, se dois ou três. Mas certamente uma criança que brinca com um computador, sozinha, por várias horas por dia, vai ter um tipo diferente de personalidade do que o de alguém que interage com outras crianças. Porém, acho que tendemos a olhar mais para o lado negativo desses novos hábitos, que é mais evidente. Mas as crianças de hoje em dia, mesmo brincando com um computador, têm que usar sua imaginação, da mesma forma como seus antepassados. Elas não estão se tornando zumbis ou robôs.

ÉPOCA - O que mudou em relação aos brinquedos nesse período?
Chudacoff
– Há duas épocas. Até o século o final do XIX, quando acontece a industrialização, os brinquedos eram objetos decorativos que tanto adultos quanto crianças poderiam ter. Mas as coisas com que as crianças brincavam eram improvisadas. Eles tinham bolas, bambolês e piões, mas era tudo muito mais improvisado. Eles usavam objetos de dentro de casa e mesmo da natureza: os vestidos da mãe, utensílios de cozinha, um tapete. Com a industrialização e o crescimento extraordinário da fabricação de brinquedos, as crianças ganharam uma nova e grande variedade de coisas para brincar – e comprar. Isso se mantém até o final do século XX, quando surgiram os brinquedos eletrônicos. Eles permitiram muitas oportunidades de brincar, mas também restringiram a liberdade da criança de improvisar. Isso porque os jogos eletrônicos não são flexíveis. Então você pode fazer coisas com uma bola, com um bastão ou com um bambolê que você não pode fazer com um jogo de computador. Você não pode criar as próprias regras, tem que seguir as que estão programadas.

ÉPOCA - O que o senhor acha da crescente presença da tecnologia nas brincadeiras das crianças?
Chudacoff
– É realmente difícil de prever o que vai acontecer. Eu não sei tanto sobre os brinquedos de hoje, mas, certamente, os eletrônicos criaram mais caminhos para as crianças conhecerem o mundo do que havia 100, 200 anos atrás. Isso tem que ser destacado. E uma das tendências que está acontecendo nos Estados Unidos é o que eu chamo no livro de "age compression" (ou compressão da idade). As crianças hoje em dia podem ter os brinquedos dos mais velhos, os tocadores de música, os jogos de computador. E o mesmo acontece com os mais velhos: eles podem ter os brinquedos dos mais novos. Está havendo cada vez menos distinção entre os brinquedos e é quase como uma volta ao passado, quando os brinquedos eram para crianças e adultos.

ÉPOCA - As crianças de hoje em dia têm mais tempo livre para brincar do que as de antigamente?
Chudacoff
– Tempo é liberdade quando se fala em brincar. E, nos Estados Unidos, os pais de todas as classes crianças estão tão preocupados em guiar e dar experiências enriquecedoras a seus filhos que acabam tomando conta do tempo de brincar. Se a família tiver dinheiro, eles comprarão tempo para as crianças em ligas de futebol, ou aulas de alguma coisa, como ginástica, além de colocá-las em um acampamento de férias. As famílias com menos dinheiro também tentarão comprar algumas dessas formas de brinquedo, mas tenderão a ter seus filhos ocupados com a televisão, o que é uma forma de prevenir que eles saiam de casa e façam algo perigoso. O tempo livre para brincadeiras tem sido reduzido.

ÉPOCA - Qual sua opinião sobre o conceito de "brinquedo educativo"?
Chudacoff –
Os brinquedos sempre foram usados para a educação. Não importa se fossem blocos de
montar ou até mesmo a Bíblia, que pode ser usada no tempo livre e ensina uma lição. Nos Estados Unidos, antes de haver brinquedos produzidos em massa pelas indústrias, havia jogos para adultos e crianças que ensinavam história, geografia, matemática. Havia jogos de tabuleiro e de cartas. Mas o conceito de um "brinquedo educativo" nasceu no começo do século XX, quando foram criadas empresas exclusivamente para fazer brinquedos que melhorassem a inteligência das crianças. Acho que o uso desses brinquedos pode ter sido exagerado. Claro que a criança pode aprender o alfabeto ou a melhorar sua leitura com um brinquedo, mas se você der uma caixa com peças de várias formas, ela também vai aprender manipulando-as e imaginando situações com elas. Um jogo de computador também pode ser educativo, mesmo que trate de um programa de televisão. Isso porque a criança terá que aprender estratégia, terá que entender como jogar, quais são as opções. Ser educativo não está ligado ao brinquedo em si, mas à forma que a criança o usa, como ela brinca com ele.

ÉPOCA - Qual é o melhor brinquedo para uma criança, em sua opinião?
Chudacoff –
O melhor brinquedo é um bastão. Pode ser chocante o que eu disse, mas, se você pensar, um bastão, uma bola ou uma caixa são o tipo de brinquedo com que todo mundo brinca. Você pode fazer tantas coisas com eles, pode usar sua imaginação e criar muito. Na maioria das vezes, as crianças enjoam dos brinquedos industrializados muito rápido.

ÉPOCA - E qual é o melhor lugar para brincar?
Chudacoff
– Não é possível identificar um só lugar mas, de maneira geral, eu diria que é o lugar onde a criança se sente independente. Pode ser no próprio quarto, em um cômodo específico da casa, no jardim ou na floresta. Algum lugar em que a criança se sinta segura e independente.

ÉPOCA - Qual é o papel dos pais na brincadeira dos filhos?
Chudacoff
– Acho que o papel dos pais é providenciar esse tipo de ambiente seguro e independente de brincadeira. Sem ser muito protetores. As crianças aprendem a cuidar de si mesmas e não se machucam com tanta freqüência quanto pensam os pais. O papel dos pais é guiar as crianças mas também permitir que as crianças assumam alguns riscos. Acho que para crianças muito novas, que não são capazes de ter seus próprios amigos, a presença dos pais nas brincadeiras é muito importante. Mas entre 6 e 12 anos, as crianças, antigamente, costumavam ficar mais sozinhas e isso era bom. Acho que atualmente os pais se sentem muito culpados quando não brincam com seus filhos, mas se esquecem de pensar que não necessariamente os filhos querem brincar com eles. Às vezes os filhos querem brincar sozinhos, criar o próprio jogo e construir uma certa autonomia.

ÉPOCA - De que forma a solidão pode ser boa para as crianças?

Chudacoff – A solidão pode ser triste, mas também pode ser inspiradora, criadora. Uma criança deitada na grama e olhando para as nuvens, tentando criar uma história a partir de suas formas, ou uma criança olhando para os próprios dedos e pensando o que é possível fazer com eles. Isso é solidão, mas é muito bom. Os pais pensam que seus filhos estão chateados. Mas se você pensar um minuto, não há razão para ficar chateado, mesmo estando sozinho e sem nada com que brincar.

ÉPOCA - Existem diferenças entre como as meninas e os meninos brincam?
Chudacoff –
De maneira geral, em quase todas as épocas, os meninos brincam entre si e as meninas também. As meninas tendem a se apropriar dos ambientes e os meninos, a alterá-los. Os meninos são mais construtivos – e também destrutivos. Além disso, meninos são mais violentos. As meninas, historicamente, também vão menos longe de casa e têm mais responsabilidades domésticas. Isso mudou um pouco depois do movimento feminista, e as meninas passaram a imitar os meninos em suas brincadeiras, como por exemplo nos esportes. Mas, apesar de as diferenças terem diminuído, os fabricantes de brinquedo continuam fazendo e anunciando brinquedos diferentes para garotos e garotas.

ÉPOCA - As crianças de diferentes classes sociais brincam de forma diferente?
Chudacoff
– As crianças de famílias ricas têm, historicamente, mais tempo livre para brincar. As crianças de famílias pobres têm que contribuir para a renda familiar, mas o que tentei mostrar em meu livro é que mesmo as crianças que trabalham incluem brincadeiras em suas tarefas. Jogos, competições. Nos últimos tempos, ficou mais claro também que, quanto mais rica a criança, mais brinquedos industrializados ela tem. Mas, por causa da industrialização e das mudanças econômicas dos Estados Unidos, a maior parte das crianças pobres também têm brinquedos. Não no mesmo número ou da mesma qualidade, mas ainda assim os têm. As diferenças de classe, nesse sentido, diminuíram nos últimos tempos.

ÉPOCA - O que o senhor acha dos lugares construídos para a diversão das crianças?
Chudacoff
– Acho que são lugares usados somente pela conveniência ou em ocasiões especiais. Há lugares para festas de aniversário, por exemplo. Para mim, são artificiais. Embora sirvam a um propósito necessário, são artificiais. A qualidade da brincadeira é menor porque esses lugares servem aos propósitos dos adultos, que precisam deixar as crianças em um lugar seguro enquanto fazem compra, por exemplo. Além disso, nos Estados Unidos, esses lugares são preocupados demais com a segurança das crianças e há muitas regras para evitar que se machuquem – e que o estabelecimento não seja processado. Até mesmo as escolas estão restringindo a liberdade das crianças. Tenho duas sobrinhas, de 8 e 9 anos, em cujas escolas não é permitido, até os 10 anos, correr, pular ou jogar bola. Nos Estados Unidos, as escolas têm medo de serem processadas pelos pais caso haja algum acidente. Hoje, metade das escolas americanas aboliram o recreio durante as aulas. Às vezes, as crianças têm tempo livre, mas não podem usá-lo para fazer atividades físicas. É uma paranóia.

O lúdico na
educação infantil

Vera Lúcia Camara F. Zacharias é mestre em educação, pedagoga, diretora de escola aposentada, com vasta experiência na área educacional em geral, e,  em especial na implantação de Cursos Técnicos de Nível Médio e pós-médio, assessoria e capacitação de profissionais para a utilização de novas tecnologias aplicadas à educação e alfabetização


 

O lúdico na educação infantil com relação ao jogo, Piaget (1998) acredita que ele é essencial na vida da criança.  De início tem-se o jogo de exercício que é aquele em que a criança repete uma determinada situação por puro prazer, por ter apreciado seus efeitos.

Em torno dos 2-3  e 5-6 anos nota-se a ocorrência dos jogos simbólicos, que satisfazem a necessidade da criança de não somente relembrar o mentalmente o acontecido, mas de executar a representação.

Em período posterior surgem os jogos de regras , que são transmitidos socialmente de criança para criança e por conseqüência vão aumentando de importância de acordo com o progresso de seu desenvolvimento social. Para Piaget, o  jogo constitue-se em expressão e condição para o desenvolvimento infantil , já que as crianças quando jogam assimilam e podem transformar a realidade.

Já Vygotsky (1998), diferentemente de Piaget, considera que o desenvolvimento ocorre ao longo da vida e que as funções psicológicas superiores são construídas ao longo dela. Ele não estabelece fases para explicar o desenvolvimento como Piaget e para ele o sujeito não é ativo nem passivo: é interativo.

Segundo ele, a criança usa as interações sociais como formas privilegiadas de acesso a informações: aprendem a regra do jogo, por exemplo, através dos outros e não como o resultado de um engajamento individual na solução de problemas.  Desta maneira, aprende a regular seu comportamento pelas reações, quer elas pareçam agradáveis ou não.

Enquanto Vygotsky fala do faz-de-conta, Piaget fala do jogo simbólico, e pode-se dizer, segundo Oliveira (1997) ,que são correspondentes.

"O brinquedo cria uma Zona de Desenvolvimento Proximal na criança". (Oliveira, 1977: 67), lembrando que ele afirma que a aquisição do conhecimento se dá através das zonas de desenvolvimento: a real e a proximal.  A zona de desenvolvimento real é a do conhecimento já adquirido, é o que a pessoa traz consigo, já a proximal, só é atingida, de início, com o auxílio de outras pessoas mais "capazes", que já tenham adquirido esse conhecimento.

"As maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu  nível básico de ação real  e moralidade (Vygotsky, 1998).

Piaget (1998) diz que a atividade lúdica é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança, sendo,  por isso, indispensável à prática educativa (Aguiar, 1977: 58).

Na visão sócio- histórica de Vygotsky, a brincadeira, o jogo, é uma atividade específica da infância, em que a criança recria a realidade usando sistemas simbólicos. Essa é uma atividade social, com contexto cultural e social.

Para Vygotsky, citado por Wajskop (1999:35): ...a brincadeira cria para as crianças uma zona de desenvolvimento proximal que não é outra coisa senão a distância entre o nível atual de desenvolvimento, determinado pela capacidade de resolver independentemente um problema, e o  nível de desenvolvimento potencial, determinado através da resolução de um problema, sob a orientação de um adulto, ou de um companheiro mais capaz.

Vygotsky, citado por Lins (1999), classifica o brincar em algumas fases: durante a primeira fase a criança começa a se distanciar de seu primeiro meio social, representado pela mãe, começa a falar, andar e movimentar-se em volta das coisas. Nesta fase, o ambiente a alcança por meio do adulto e pode-se dizer que a fase estende-se até em torno dos sete anos. A segunda fase é caracterizada pela imitação, a criança copia os modelos dos adultos. A terceira fase é marcada pelas convenções que surgem de regras e convenções a elas associadas.

Vygotsky (1989: 109), ainda afirma que: é enorme a influência do brinquedo no desenvolvimento de uma criança. É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de numa esfera visual externa, dependendo das motivações e tendências internas, e não por incentivos fornecidos por objetos externos".

A noção de "zona proximal de desenvolvimento" interliga-se portanto, de maneira muito forte, à sensibilidade do professor em  relação às necessidades e capacidades da criança e à sua aptidão para utilizar as contingências do meio  a fim de dar-lhe a possibilidade de passar do que sabe fazer para o que não sabe. (Pourtois, 199: 109).

As brincadeiras que são oferecidas à criança devem estar de acordo com a zona de desenvolvimento em que ela se encontra, desta forma, pode-se perceber a importância do professor conhecer a teoria de Vygotsky.

No processo da educação infantil o papel do professor é de suma importância, pois é ele quem cria os espaços, disponibiliza materiais, participa das brincadeiras, ou seja, faz a mediação da construção do conhecimento.

A desvalorização do movimento natural e espontâneo da criança em favor do conhecimento estruturado e formalizado, ignora as dimensões educativas da brincadeira e do jogo como forma rica e poderosa de estimular a atividade construtiva da criança. É urgente e necessário que o professor procure ampliar cada vez mais as vivências da criança com o ambiente físico, com brinquedos, brincadeiras e com outras crianças.

O jogo, compreendido sob a ótica do brinquedo e da criatividade, deverá encontrar maior espaço para ser entendido como educação, na medida em que os professores compreenderem melhor toda sua capacidade potencial de contribuir para com o desenvolvimento da criança.

NEGRINE (1994:20), em estudos realizados sobre aprendizagem e desenvolvimento infantil, afirma que "quando a criança chega à escola, traz consigo toda uma pré-história, construída a partir de suas vivências, grande parte delas através da atividade lúdica".

Segundo esse autor, é fundamental que os professores tenham conhecimento do saber que a criança construiu na interação com o ambiente familiar e sociocultural, para formular sua proposta pedagógica.

Entendemos, a partir dos princípios aqui expostos, que o professor deverá contemplar a brincadeira como princípio norteador das atividades didático-pedagógicas, possibilitando às manifestações corporais encontrarem significado pela  ludicidade presente na relação que as crianças mantêm com o mundo.

Porém essa perspectiva não é tão fácil de ser adotada na prática. Podemos nos perguntar: como colocar em prática uma proposta de educação infantil em que as crianças desenvolvam, construam/adquiram conhecimentos e se tornem autônomas e cooperativas? 
Como os professores favorecerão a construção de conhecimentos se não forem desafiados a construírem os seus?
O caminho que parece possível implica pensar a formação permanente dos profissionais que nela atuam.

"é preciso que os profissionais de educação infantil tenham acesso ao conhecimento produzido na área da educação infantil e da cultura em geral, para repensarem sua prática, se reconstruírem enquanto cidadãos e atuarem enquanto sujeitos da produção de conhecimento. E para que possam, mais do que "implantar" currículos ou "aplicar" propostas à realidade da creche/pré-escola em que atuam, efetivamente participar da sua concepção, construção e consolidação". (Kramer apud MEC/SEF/COEDI, 1996 p.19).

Referências bibliográficas:

KRAMER, Sonia. Currículo de Educação Infantil e a Formação dos Profissionais de Creche e Pré-escola: questões teóricas e polêmicas. In: MEC/SEF/COEDI. Por uma política de formação do profissional de Educação Infantil. Brasília-DF. 1994a

 
 

LINS, Maria Judith Sucupira da Costa. 1999. O direito de brincar: desenvolvimento cognitivo e a imaginação da criança na perspectiva de Vygotsky. In: XIII CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA OMEP. Paraíba. Anais do XIII Congresso Brasileiro de Educação Infantil da OMEP. p. 41-47.

 
 

NEGRINE, Airton. Aprendizagem e desenvolvimento infantil. Porto Alegre: Prodil, 1994.

 
 

OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos de (org). 2000. Educação infantil: muitos olhares. 4.ed. São Paulo: Cortez.

 
 

Piaget, J. A psicologia da criança. Ed Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.

 
 

Pourtois & Desmet. A educação pós-moderna. Loyola, 1999.

 
 

VYGOTSKY, L. 1989. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes.

 
 

WAJSKOP, Gisela. 1995. O brincar na educação infantil. Caderno de Pesquisa, São Paulo, n.92, p. 62-69, fev.

_____ 1999. Brincar na pré-escola. 3.ed. São Paulo: Cortez.

Jogo, Brinquedo e Brincadeira - Uma Revisão Conceitual

Janice Vidal Bertoldo

Maria Andrea de Moura Ruschel

A pergunta feita pelo professor: "- Vamos brincar? " ou ainda: "- Vamos jogar?" pode surtir o mesmo efeito em seus alunos por se tratar, afinal, de duas palavras com o mesmo significado, ou ele está propondo duas atividades, que por serem distintas, podem dividir o grupo entre os que responderão: "eu prefiro brincar" e os que dirão "eu prefiro jogar"?

Certamente encontraremos professores que utilizam as palavras jogo, brinquedo e brincadeira como sinônimos. Outros, no entanto, marcam uma diferençaentre elas que remonta à sua própria história de vida.

Podemos pensar, portanto, que há pelo menos dois aspectos implicados nessa questão. O primeiro diz respeito às palavras poderem assumir diferentes significados desde a nossa infância, bem como ao longo da fase adulta. Ou seja, antes mesmo da formação profissional e com ela possíveis reflexões desde o ponto-de-vista de Piaget, Winnicott e outros, tais conceitos já estavam marcados pelas vivências de cada um, desde o lugar de crianças que nomeavam o seu brincar.

O segundo aspecto refere-se aos diferentes significados que uma mesma palavra pode assumir ao longo dos tempos. Se pegarmos um dicionário de 50 anos atrás certamente a acepção das palavras jogo, brinquedo e brincadeira estarão impregnadas de uma visão da época. Nos dias de hoje, observamos que há uma clara diferença entre jogo e brinquedo e entre brincadeira e brinquedo. No entanto, tanto jogo e brincadeira, podem ser sinônimos de divertimento. Vejamos como esses termos são definidos no dicionário Larousse:

"Jogo = Ação de jogar; folguedo, brinco, divertimento". Seguem-se alguns exemplos: "jogo de futebol; Jogos Olímpicos; jogo de damas; jogos de azar; jogo de palavras; jogo de empurra".

"Brinquedo = objeto destinado a divertir uma criança".

"Brincadeira = ação de brincar, divertimento. / Gracejo, zombaria. / Festinha entre amigos ou parentes. / Qualquer coisa que se faz por imprudência ou leviandade e que custa mais do que se esperava: aquela brincadeira custou-me caro".

A ambigüidade entre os termos se consolida com o uso que as pessoas fazem dela. A primeira e talvez mais forte imagem que vem à mente a quase todos, quando se fala em jogo, consiste em duas pessoas sentadas jogando (xadrez, cartas, damas, etc.). Ou seja, dentro dessa idéia não há movimento. No entanto, o jogo por si só, se constitui em ação e, assim, associado ao movimento.

É claro, porém que, além das diferenças, esses conceitos também possuem pontos em comum. Um deles é o de que tanto o jogo quanto a brincadeira são culturais. É difícil encontrarmos exemplos de um jogo ou uma brincadeira que sendo originário de uma cultura, tenha sido assimilado por outra. Não fosse assim, de tanto assistirmos filmes norte-americanos e convivermos com pessoas que viajam constantemente aos Estados Unidos trazendo "novidades" de lá, nós já estaríamos hoje jogando beisebol, e nossas crianças estariam brincando de "doces ou travessuras" na noite de Halloween.

Revisão Conceitual

Frente a estes distintos paradigmas nos propomos a contribuir com algumas reflexões sobre o assunto e, paralelamente, realizar uma revisão conceitual quanto ao jogo, a brincadeira e o brinquedo, na visão de Benjamin, Didonet, Froebel, Piaget, Vygotsky e Winnicott.

Benjamin

Benjamin fez algumas reflexões importantes sobre o lúdico, considerando o seu aspecto cultural. Brinquedo e brincar, para ele, estão associados, e documentam como o adulto se coloca em relação ao mundo da criança.

Os estudos de Benjamin mostraram como, desde as origens, o brinquedo sempre foi um objeto criado pelo adulto para a criança. Segundo Benjamin, acreditava-se erroneamente que o conteúdo imaginário do brinquedo é que determinava as brincadeiras infantis, quando na verdade quem faz isso é a criança. Por esta razão, quanto mais atraentes forem os brinquedos, mais distantes estarão do seu valor como instrumentos do brincar.

É através do brincar que a criança se encontra com o mundo de corpo e alma. Percebe como ele é e dele recebe elementos importantes para a sua vida, desde os mais insignificantes hábitos, até fatores determinantes da cultura de seu tempo. Também é através do brincar que a criança vê e constrói o mundo, expressa aquilo que tem dificuldade de colocar em palavras. Sua escolha é motivada por processos e desejos íntimos, pelos seus problemas e ansiedades. É brincando que a criança aprende que, quando se perde no jogo, o mundo não se acaba.

Didonet

Didonet afirma que todas as culturas, desde as mais remotas eras, produziram e utilizaram brinquedos. A boneca e a bola são dos mais antigos que se tem notícia e mais difundidos em todas as culturas. Em túmulos egípcios de 4 a 5 mil anos atrás foram encontradas bonecas. Nas civilizações andinas, as crianças eram enterradas com elas.

O interesse pelo estudo do brinquedo também é muito antigo. E isso talvez decorra do fato de que o brinquedo e o jogo façam parte tão intrínseca da vida infantil e juvenil. Entender seu significado é um caminho muito útil, senão mesmo necessário, para conhecer a própria criança e seu processo de desenvolvimento. O brinquedo foi objeto de consideração de filósofos, psicólogos, psicanalistas, teólogos, antropólogos, médicos, terapeutas, educadores e pais, portanto, nos mais diversos campos das ciências e das práticas sociais.

O brincar é algo tão espontâneo, tão natural, tão próprio da criança, que não haveria como entender sua vida sem brinquedo. É preciso ressaltar, no entanto, que não é apenas uma atividade natural. É, sobretudo, uma atividade social e cultural. Desde o começo, o brinquedo é uma forma de relacionar-se, de estar com, de encontrar o mundo físico e social. Para Vital Didonet:

"É uma verdade que o brinquedo é apenas o suporte do jogo, do brincar, e

que é possível brincar com a imaginação. Mas é verdade, também, que sem

brinquedo é muito mais difícil realizar a atividade lúdica, porque é ele que

permite simular situações (...) Se criança gosta de brincar, gosta também de

brinquedo. Porque as duas coisas estão intrinsecamente ligadas".

Didonet salienta que é necessário passar as informações e conhecimentos sobre a importância do brinquedo para a criança e o significado para o seu desenvolvimento afetivo, social, cognitivo e físico.

Froebel, [in Kishimoto, 98]

Entendendo que Froebel é uma figura significativa no contexto educativo, porque traz uma importante contribuição quanto ao papel do jogo, acreditamos que suas idéias sejam fundamentais no sentido de controntá-las com as demais. No entanto, em virtude da dificuldade de encontrar material a seu respeito, consideramos adequado o referencial de Kishimoto, já que a mesma faz uma relevante abordagem sobre Froebel.

"Embora não tenha sido o primeiro a analisar o valor educativo do jogo,

Froebel foi o primeiro a colocá-lo como parte essencial do trabalho

pedagógico, ao criar o jardim de infância com uso dos jogos e brinquedos.

A partir de sua filosofia educacional baseada no uso dos jogos infantis,

Froebel delineia a metodologia dos dons e ocupações, dos brinquedos e jogos,

proponto:1 dons, materiais como bola, cubo, varetas, anéis etc., que permitem

a realização de atividades denominadas ocupações, sob a orientação da

jardineira, e 2 brinquedos e jogos, atividades simbólicas, livres,

acompanhadas de músicas e movimentos corporais, destinadas a liberar a

criança para a expressão das relações que estabelece sobre objetos e

situações do seu cotidiano. Os brinquedos são atividades imitativas livres, e

os jogos, atividades livres com o emprego dos dons".

"Brincar é a fase mais importante da infância - do desenvolvimento humano

neste período - por ser a auto-ativa representação do interno - a

representação de necessidades e impulsos internos. (Froebel, 1912c, pp. 54-

55)

... A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estágio e,

ao mesmo tempo, típica da vida humana enquanto um todo - da vida natural

interna no homem e de todas as coisas. Ela dá alegria, liberdade,

contentamento, descanso externo e interno, paz com o mundo... A criança que

brinca sempre, com determinação auto-ativa, perseverando, esquecendo sua

fadiga física, pode certamente tornar-se um homem determinado, capaz de

auto-sacrifício para a promoção do seu bem e de outros... Como sempre

indicamos, o brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de

profunda significação. (Froebel, 1912c, p. 55)

Embora justificando-a por uma teoria metafísica e valendo-se do pressuposto

romântico que a concebe como atividade inata da criança, Froebel postula a

brincadeira como ação metafórica, livre e espontânea da criança. Aponta, no

brincar, características como atividade representativa, prazer,

autodeterminação, valorização do processo de brincar, seriedade do brincar,

expressão de necessidades e tendências internas aproximando-se de autores

conhecidos como Henriot (1893, 1989), Brougère (1995), Vygotsky (1987,

1988, 1982), Piaget (1977, 1978) e tantos outros. Para Froebel, a brincadeira

é importante para o desenvolvimento da criança, especialmente nos primeiros

anos".

Piaget

Piaget estrutura o jogo em três categorias: o jogo de exercício - onde o objetivo é exercitar a função em si -, o jogo simbólico - onde o indivíduo se coloca independente das características do objeto, funcionando em esquema de assimilação, e o jogo de regra, no qual está implícita uma relação inter individual que exige a resignação por parte do sujeito. Piaget cita ainda uma quarta modalidade, que é o jogo de construção, em que a criança cria algo. Esta última situa-se a meio caminho entre o jogo e o trabalho, pelo compromisso com as características do objeto. Tais modalidades não se sucedem simplesmente acompanhando as etapas das estruturas cognitivas, pois, tanto o bebê pode fazer um jogo de exercício, como também uma criança poderá fazer sucessivas perguntas só pelo prazer de perguntar.

Para ele, a origem do jogo está na imitação que surge da preparação reflexa.

Imitar consiste em reproduzir um objeto na presença do mesmo. É um processo de assimilação funcional, quando o exercício ocorre pelo simples prazer. A essa modalidade especial de jogo, Piaget denominou de jogo de exercício. Em suas pesquisas ele mostra que a imitação passa por várias etapas até que, com o passar do tempo, a criança é capaz de representar um objeto na ausência do mesmo. Quando isso acontece, significa que há uma evocação simbólica de realidades ausentes. É uma ligação entre a imagem (significante) e o conceito (significado), capaz de originar o jogo simbólico, também chamado de faz-de-conta.

Para Piaget, o símbolo nada mais é do que um meio de agregar o real aos desejos e interesses da criança.

Paulatinamente, o jogo simbólico vai cedendo lugar ao jogo de regras, porque a criança passa do exercício simples às combinações sem finalidade e depois com finalidade. Esse exercício vai se tornando coletivo, tendendo a evoluir para o aparecimento de regras que constituem a base do contrato moral.

As regras pressupõem relações sociais ou interpessoais. Elas substituem o símbolo, enquadrando o exercício nas relações sociais. As regras são, para Piaget, a prova concreta do desenvolvimento da criança.

Vygotsky

O brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal (capacidade que a criança possui), pois na brincadeira a criança comporta-se num nível que ultrapassa o que está habituada a fazer, funcionando como se fosse maior do que é.

O jogo traz oportunidade para o preenchimento de necessidades irrealizáveis e também a possibilidade para exercitar-se no domínio do simbolismo. Quando a criança é pequena, o jogo é o objeto que determina sua ação.

Na medida em que cresce, a criança impõe ao objeto um significado. O exercício do simbolismo ocorre justamente quando o significado fica em primeiro plano.

Do ponto de desenvolvimento da criança, a brincadeira traz vantagens sociais, cognitivas e afetivas.

Ainda, segundo esse autor, a brincadeira possui três características: a imaginação, a imitação e a regra. Elas estão presentes em todos os tipos de brincadeiras infantis, tanto nas tradicionais, naquelas de faz-de-conta, como ainda nas que exigem regras. Podem aparecer também no desenho, como atividade lúdica.

Do ponto de vista psicológico, Vygotsky atribui ao brinquedo um papel importante, aquele de preencher uma atividade básica da criança, ou seja, ele é um motivo para a ação.

Segundo o autor, a criança pequena, por exemplo, tem uma necessidade muito grande de satisfazer os seus desejos imediatamente. Quanto mais jovem é a criança, menor será o espaço entre o desejo e sua satisfação. No pré-escolar há uma grande quantidade de tendências e desejos não possíveis de ser realizados imediatamente, e é nesse momento que os brinquedos são inventados, justamente para que a criança possa experimentar tendências irrealizáveis.

A impossibilidade de realização imediata dos desejos cria tensão, e a criança se envolve com o ilusório e o imaginário, onde seus desejos podem ser realizados. É o mundo dos brinquedos.

Segundo Vygotsky, a imaginação é um processo novo para a criança, pois constitui uma característica típica da atividade humana consciente. É certo, porém, que a imaginação surge da ação, e é a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais. Isso não significa necessariamente que todos os desejos não satisfeitos dão origem aos brinquedos.

Winnicott

Para Winnicott, a brincadeira é universal e própria da saúde: o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde. O brincar conduz aos relacionamentos grupais, podendo ser uma forma de comunicação na psicoterapia. Portanto, a brincadeira traz a oportunidade para o exercício da simbolização e é também uma característica humana. Conforme Outeiral (1998) [7] , o trabalho de Winnicott: "Por que brincam as crianças?" (1942), apresenta algumas motivações da atividade lúdica: para buscar prazer, para expressar agressão, para controlar a ansiedade, para estabelecer contatos sociais, para realizar a integração da personalidade e, por fim, para comunicar-se com as pessoas.

Sua contribuição mais original ao tema, entretanto, é o desenvolvimento dos aspectos dos objetos transicionais e fenômenos transicionais (1951, 1971), para descrever a experiência de viver em uma área de transição da experiência, isto é, transição com respeito à realidade interna e externa. Na obra "A Criança e seu Mundo" (1976), Winnicott faz colocações fundamentais sobre a brincadeira. Dentre elas podemos citar:

"As crianças têm prazer em todas as experiências de brincadeira física e

emocional (...)";

"(...) Deve-se aceitar a presença da agressividade, na brincadeira da criança

(...)";

"A angústia é sempre um fator na brincadeira infantil e, freqüentemente, um

fator dominante";

"(...) A brincadeira é a prova evidente e constante da capacidade criadora,

que quer dizer vivência".

"(...) As brincadeiras servem de elo entre, por um lado, a relação do indivíduo

com a realidade interior, e por outro lado, a relação do indivíduo com a

realidade externa ou compartilhada";

"Os adultos contribuem; neste ponto, pelo reconhecimento do grande lugar

que cabe à brincadeira e pelo ensino de brincadeiras tradicionais, mas sem

obstruir nem adulterar a iniciativa própria da criança".

Considerando a Pergunta Inicial

As discussões feitas pelos pesquisadores que procuram entender o ato de brincar da criança pequena, a partir das teorias aqui presentes, vêm em auxílio dos profissionais que, atualmente, buscam revisar seus conceitos acerca do que é brincar, para a criança, e como manter esse jogo no cotidiano infantil. Baseado em tais teorias, verificamos que, ao brincar, a criança constrói conhecimento. E para isto uma das qualidades mais importantes do jogo é a confiança que a criança tem, quanto à própria capacidade de encontrar soluções. Confiante, pode chegar às suas próprias conclusões de forma autônoma.

Assim, afirmamos que tanto o jogo quanto a brincadeira como o brinquedo podem ser englobados em um universo maior, chamado de ato de brincar. Não somos favoráveis a uma rigidez dos termos, pois se por um lado a discussão sobre os mesmos pode ampliar a perspectiva lúdica de nossa prática pedagógica, por outro pode seccioná-la em hora do jogo ou hora da brincadeira.

Podemos observar que brincar não significa simplesmente recrear-se, isto porque é a forma mais completa que a criança tem de comunicar-se consigo mesma e com o mundo.

Nesse brincar está a verbalização, o pensamento, o movimento, gerando canais de comunicação.

A presente idéia vem ao encontro de acreditarmos que a linguagem cultural própria da criança é o lúdico. A criança comunica-se através dele e por meio dele irá ser agente transformador, sendo o brincar um aspecto fundamental para se chegar ao desenvolvimento integral da criança.

Portanto, o ato de brincar é importante, é terapêutico, é prazeroso, e o prazer é ponto fundamental da essência do equilíbrio humano. Logo, podemos dizer que a ludicidade é uma necessidade interior, tanto da criança quanto do adulto. Por conseguinte a necessidade de brincar é inerente ao desenvolvimento.

No brincar, quanto mais papéis a criança representar, mais amplia sua expressividade, entendida como uma totalidade. A partir do brincar ela constrói os conhecimentos através dos papéis que representa, amplia ao mesmo tempo dois vocabulários - o lingüístico e o psicomotor - além do ajustamento afetivo emocional que atinge na representação desses papéis.

A criança brinca porque tem um papel, um lugar específico na sociedade, e não apenas porque o faz-de-conta - como o brincar de cavalo, em que a criança se utiliza do cabo de vassoura - parte da natureza de tal criança. O jogo é a forma que as crianças encontram para representar o contexto em que estão inseridas.

Além disso, o ato de brincar pode incorporar valores morais e culturais em que as atividades lúdicas devem visar a auto-imagem, a auto-estima, o auto conhecimento, a cooperação, porque estes conduzem à imaginação, à fantasia, à criatividade, à criticidade e a uma porção de vantagens que ajudam a moldar suas vidas, como crianças e como adultos. E sem eles a criança não irá desenvolver suficientemente o processo de suas habilidades.

O modo como ela brinca revela o mundo interior da mesma, proporcionando o aprender fazendo, entendido aqui por aquelas ações concretas da criança. O brincar de médico, por exemplo. Implica apropriar-se de algumas características do ato da realidade. É a reprodução do meio em que a criança está inserida.

Através do lúdico, a criança realiza aprendizagem significativa. Assim, podemos afirmar que o jogo propõe à criança um mundo do tamanho de sua compreensão, no qual ela experimenta várias situações, entre elas o fazer comidinha, o limpar a casa, o cuidar dos filhos, etc.

O ato de brincar proporciona às crianças relacionarem as coisas umas com as outras, e ao relacioná-las é que elas constróem o conhecimento. Esse conhecimento é adquirido pela criação de relações e não por exposição a fatos e conceitos isolados, e é justamente através da atividade lúdica que a criança o faz. O brincar é o meio de expressão e crescimento da criança.

A criança sempre brinca, mas esse ato depende do contexto em que está inserida, independente de época, classe social e outros fatores.

Podemos considerar que, desde os primeiros anos da infância, encontram-se processos criativos que se refletem sobretudo nos jogos. É através deles que as crianças reelaboram, criativamente, combinando fatos entre si e construindo novas realidades de acordo com seus gestos e necessidades. Também nestes jogos aparece toda a experiência acumulada da criança. Neles as lideranças são desenvolvidas, e aí ela aprende a obedecer e respeitar regras e normas.

No brincar, ocorre um processo de troca, partilha, confronto e negociação, gerando momentos de desequilíbrio e equilíbrio, e propiciando novas conquistas individuais e coletivas. Constatamos, então, que a ação de brincar é fonte de prazer e ao mesmo tempo, de conhecimento.

Acreditamos, assim, que a criança vai construindo seu conhecimento do mundo de modo lúdico, transformando o real com os recursos da fantasia e da imaginação. Tem a chance de dar vazão a uma afetividade que, freqüentemente, é tolhida na difícil luta pela sobrevivência enfrentada dia-a-dia por seus pais.

A criança que brinca, precisa ser respeitada, pois seu mundo é mutante, e está em permanente oscilação entre fantasia e realidade. Precisa tanto de brinquedos como de espaço, o suficiente para que se sinta à vontade e dona do mesmo.

É através da atividade lúdica que a criança prepara-se para a vida, assimilando a cultura do meio em que vive, a ele se integrando, adaptando-se às condições que o mundo lhe oferece e aprendendo a competir, cooperar com seus semelhantes, e conviver como um ser social.

Em síntese, além de proporcionar prazer e diversão, o jogo pode representar um desafio e provocar o pensamento reflexivo da criança.

A finalidade deste trabalho consistiu em propor uma mudança conceitual para as práticas cotidianas de jogo com crianças em idade infantil.

Com base nas idéias de Benjamin, Didonet, Froebel, Piaget, Vygotsky e Winnicott, buscamos levantar algumas questões que provoquem reflexões nos profissionais que atuam nesta área, de forma a repensar a sua práxis.

Bibliografia

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